quarta-feira, 29 de julho de 2009


Confissão

Não amei bastante meu semelhante, não catei o verme nem curei a sarna.
Só proferi algumas palavras, melodiosas, tarde, ao voltar da festa.
Dei sem dar e beijei sem beijo. (Cego é talvez quem esconde os olhos embaixo do catre).
E na meia-luz tesouros fanam-se, os mais excelentes.
Do que restou, como compor um homem e tudo que ele implica de suave, de concordâncias vegetais, murmúrios de riso, entrega, amor e piedade?
Não amei bastante sequer a mim mesmo,contudo próximo.
Não amei ninguém. Salvo aquele pássaro – vinha azul e doido –que se esfacelou na asa do avião.


Carlos Drummond de Andrade

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